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Quem sou eu sem o outro?

O retrato do momento é ou ou não é uma pessoa presa ao seu smartphone? Os celulares são tudo, inclusive aparelhos que fazem ligação. Essa caricatura dos tempos pós-modernos tem sido objeto de inúmeros questionamentos, posto que essa conectividade nos deixa cada vez menos conectado com o outro como pessoa. É de se questionar: Como ficarão as relações depois da era digital?

A proximidade, a responsabilidade com os relacionamentos e com os vínculos afetivos são colocados em xeque ao anabolizarmos nosso narciso e repensarmos se vale à pena o sofrimento e a frustração comuns ao contato face à face. O discurso em prol do não envolvimento, do estar sozinho, do “eu me basto” e do “me amar acima de tudo”, casa perfeitamente bem com a dinâmica superficial dos likes como demonstração de afeto. O interessante é que mesmo protegidas pela guarda das telas, não alcançamos a autonomia afetiva que almejamos e a segurança se desmonta no post que não foi curtido por alguém ou no simples unfollow (deixar de seguir), motivando rancores e intrigas virtuais. Chego a me perguntar se os melindres no habitat digital não são um tanto maiores.

As queixas em consultório quanto à solidão e a tristeza por consequência, os relatos de sensação de vazio e de falta de sentido, mesmo em pessoas altamente produtivas e engajadas em suas tarefas se chocam com o discurso do “já me acostumei a estar só”, “antes só do que mal acompanhado”, “esgotei minha cota de amor pelo outro, agora é só amor-próprio”. A sensação é de que estamos envenenados pelo próprio ego, assim não nos damos conta de parar, refletir e voltar uma casa no tabuleiro da vida.

A problemática sobre as relações não é de hoje, ainda que nos últimos vinte ou trinta anos tenha se agravado. O Estudo sobre o Desenvolvimento Adulto (Study of Adult Development, no original em inglês) que foi encabeçado pela Universidade de Harvard há mais de oito décadas surpreende ao concluir a tamanha importância na qualidade de nossos relacionamentos para nos mantermos felizes e saudáveis ao longo da vida. “O que descobrimos é que, no caso das pessoas mais satisfeitas em seus relacionamentos, mais conectadas ao outro, seu corpo e cérebro permanecem saudáveis por mais tempo”, afirma o psiquiatra americano Robert Waldinger. E ele continua: “Uma relação de qualidade é uma relação em que você se sente seguro, em que você pode ser você mesmo. Claro que nenhum relacionamento é perfeito, mas essas são qualidades que fazem com que a gente floresça”. Para Waldinger, a tendência é nos isolarmos, ficar em casa para ver televisão ou nas redes sociais, mas é perceptível que somos mais felizes quando não estamos fazendo isso. É importante entender que investir em um relacionamento significa estar presente.

Então se você busca um remédio sem necessidade de prescrição médica, além de atividade física e dieta saudável, busque vínculos, refaça-os, crie novos, olhe ao seu redor, perceba o outro além das telas, abrace, chore, sorria, frustre-se, perdoe, renove-se. Através do outro a gente se reconhece. E cuidado com o império narcisista que vem conquistando territórios e construindo muros em torno de cada um.

Dr. Thiago Macedo – Psiquiatra (Cremec:12661 / RQE: 7978)

Bacharelado em Medicina pela Universidade Federal do Ceará

Residência em Psiquiatria pela Secretaria de Saúde do Estado da Bahia – Hospital Juliano Moreira

Contato: (88) 98116-1998/ 99942-1999

[email protected]

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