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88% dos fósseis da Bacia do Araripe estão no exterior, denuncia estudo
As peças analisadas foram descritas nos últimos 30 anos
Yanne Vieira
Fósseis
Foto: Reprodução dos autores no artigo Digging

Nesta quarta-feira (2), um estudo publicado no jornal da entidade britânica Royal Society analisou as últimas três décadas de estudos paleontológicos no México e no Brasil. De acordo com o estudo, entre 1990 e 2020, 88% dos macrofósseis do período Cretáceo, provenientes da Bacia do Araripe, estão em coleções estrangeiras. Os pesquisadores apontam que as práticas colonialistas aprofundam as desigualdades globais na pesquisa paleontológica.

O levantamento foi realizado pelos autores Juan Carlos Cisneros, da Universidade Federal do Piauí (UFPI), e Emma M. Dunne, paleobiologista da Universidade Birmingham no Reino Unido. O estudo teve, ainda, a contribuição de autores dos dois países abordados no levantamento. No Cariri, um dos pesquisadores envolvidos foi Renan Bantim, do Laboratório de Paleontologia, Departamento de Ciências Biológicas, Universidade Regional do Cariri (URCA) e Marcos Sales, do Instituto Federal de Educação, Ciência e Tecnologia do Ceará (IFCE), Campus Acopiara.

“A Bacia do Araripe tem sido uma fonte para o mercado ilícito de fósseis”

Desde 1942, os fósseis são considerados patrimônio da União e são protegidos por lei, sendo proibida a retirada e exportação desses materiais do país, sem a autorização da Agência Nacional de Mineração (ANM). Além dessa lei, em 1990, o governo brasileiro publicou um decreto que regulamenta expedições científicas estrangeiras que coletam material biológico ou paleontológico no país, sendo autorizadas desde que haja coparticipação e co-responsabilidade de instituição brasileira reconhecida.

O estudo aponta ainda, que 59,15% das publicações analisadas foram lideradas por pesquisadores estrangeiros e mais da metade dessas publicações, 57,14%, não mostraram evidências de colaboração com pesquisadores brasileiros locais.

O levantamento revela que a compra de fósseis é considerada uma válida possibilidade nos casos em que: os fósseis são mantidos em instituições estrangeiras; licenças de exportação não são mencionadas; o trabalho de campo é mencionado, mas não está claro se os próprios autores coletaram o fóssil; os dados de proveniência são vagos e/ou o trabalho de campo não é mencionado (ou seja, o fóssil “aparece” de repente em coleção estrangeira); ou compra é reconhecida diretamente nas publicações.

Sugestões dos autores

“A história extrativista da paleontologia colonialista não pode ser reescrita, mas podemos traçar um novo caminho com base em uma cooperação respeitosa que beneficia mutuamente tanto as instituições locais como estrangeiras, bem como as comunidades locais que permanecem como os guardiões de seu patrimônio paleontológico”, finaliza o estudo.

Prática comum

Mesmo o Geopark Araripe sendo reconhecido como território UNESCO, além das leis de proteção ao patrimônio da união, a região é alvo de tráfico de fósseis desde a década de 90.

Rafael Rayol, procurador da República responsável pela investigação das peças, destaca que existem dezenas de procedimentos de repatriação de fósseis brasileiros tramitando em, pelo menos, seis países, como Itália, França, Alemanha, Holanda, Espanha, Japão e Coreia do Sul.

Na maioria dos casos, segundo Rayol, a venda ilegal dos objetos é denunciada por pesquisadores que os encontram em leilões, coleções particulares, ou, até mesmo, sendo expostos em museus pelo mundo.

Outras peças

Em 2021, o Ministério Público Federal obteve decisão favorável pela Justiça francesa para a repatriação de quase mil fósseis, também oriundos da Chapada do Araripe. O material inclui 34 caixas contendo 345 pedras de animais fossilizados e 648 pequenos quadrados de animais e plantas em formato de fóssil.

De acordo com o MPF, conforme consta nos autos, os fósseis foram apreendidos em agosto de 2013, no porto de Havre, que é um dos principais da França, localizado na região da Normandia. Sobre este caso, Rayol adiantou que as 998 peças devem retornar ao Brasil em maio deste ano.

O caso do dinossauro brasileiro

O Museu Estadual de História Natural de Karlsruhe (SMNK), da Alemanha, se recusa a devolver o fóssil do dinossauro brasileiro, Ubirajara jubatus, também oriundo da Bacia do Araripe.

A espécie foi apresentada em um estudo científico publicado na revista Cretaceous Research, em dezembro de 2020. Um mês depois, o artigo foi retirado devido à polêmica sobre a legalidade da peça, que foi levada do Brasil ainda em 1995.

A campanha “Ubirajara belongs to Brazil” (Ubirajara pertence ao Brasil), ganhou força nas redes sociais nos últimos meses e fez o Museu de Karlsruhe se manifestar em seus perfis oficiais, apesar da repercussão, a instituição se defende, alegando que o material é de propriedade alemã porque foi importado em conformidade com os regulamentos da época.

 

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